Uma rede clandestina, com atuação semelhante à de um serviço secreto paralelo, foi desmantelada pela Polícia Federal nesta quarta-feira (28). A operação, batizada de Sisamnes – em sua sétima fase –, revelou um grupo criminoso que oferecia, por valores estipulados em uma tabela, serviços de espionagem contra autoridades e assassinatos sob encomenda.
O esquema, identificado como “Comando C4”, reunia militares da ativa, reservistas e civis em um modelo de organização estruturado com disciplina quase militar. Seu nome é uma sigla para “Comando de Caça a Comunistas, Corruptos e Criminosos”, e refletia, segundo os investigadores, uma ideologia radical utilizada como justificativa para os crimes cometidos.
Segundo a PF, o grupo chegou a cobrar R$ 250 mil para vigiar clandestinamente ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), com o uso de drones e agentes infiltrados. Senadores e deputados também estavam entre os alvos, com preços de R$ 150 mil e R$ 100 mil, respectivamente.
O cerco da polícia ocorreu após o assassinato do advogado Roberto Zampieri, em dezembro de 2023, em Cuiabá (MT). Ao acessar o celular da vítima, os investigadores se depararam com provas concretas de uma rede de serviços ilícitos, que incluíam negociação de decisões judiciais, planejamento de homicídios e espionagem de autoridades públicas.
Espionagem profissionalizada
O Comando C4 utilizava tecnologia de ponta e estratégias de infiltração para monitorar seus alvos. Prostitutas eram aliciadas para se aproximar de figuras públicas e coletar informações, enquanto drones registravam movimentações à distância. A estrutura imitava operações de inteligência e operava com discrição, dificultando sua identificação.
Além disso, o grupo mantinha uma “tabela da morte” com valores definidos para a execução de homicídios, de acordo com a posição ou relevância da vítima. As cifras variavam conforme o alvo: figuras públicas, advogados, empresários ou mesmo operadores do Judiciário.
Prisões e buscas
A pedido do ministro Cristiano Zanin, do STF, a Polícia Federal cumpriu cinco mandados de prisão preventiva, quatro ordens de monitoramento eletrônico e seis mandados de busca e apreensão nos estados de Mato Grosso, São Paulo e Minas Gerais. Entre as medidas determinadas, estão também o recolhimento domiciliar noturno e a proibição de contato entre os investigados.
Foram presos:
• Aníbal Manoel Laurindo: produtor rural, apontado como mandante do assassinato de Zampieri;
• Coronel Luiz Cacadini: militar da reserva, acusado de financiar a operação criminosa;
• Antônio Gomes da Silva: suspeito de ter executado o advogado;
• Hedilerson Barbosa: intermediador e dono da arma usada no crime;
• Gilberto Louzada da Silva: cuja participação segue sob apuração.
Venda de sentenças
As investigações também apontam para um esquema de corrupção no Judiciário, envolvendo a venda de decisões judiciais em tribunais do Mato Grosso, com possíveis ramificações no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Anotações encontradas no celular de Zampieri e mensagens recuperadas pela PF indicam que o Comando C4 atuava como elo entre interessados e operadores jurídicos dispostos a “negociar” sentenças por valores significativos.
A apuração continua e a Polícia Federal não descarta novos desdobramentos, inclusive com o envolvimento de autoridades de diferentes esferas da administração pública.
Com informações sigilosas sendo checadas e uma rede ainda em investigação, a Operação Sisamnes se tornou um dos mais impactantes movimentos da PF contra o crime organizado de Estado — onde política, violência e espionagem se entrelaçam.