
Em meio às investigações da Polícia Federal (PF) sobre um esquema de venda de sentenças judiciais no Tocantins, um novo episódio adiciona tensão ao caso. Em áudio encontrado no celular do advogado Thiago Marcos Barbosa de Carvalho, preso no âmbito da Operação Sisamnes, o prefeito de Palmas, Eduardo Siqueira Campos (Podemos), afirma que recebeu, em 2010, informações privilegiadas de um ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre uma operação da PF prestes a ser deflagrada.
Segundo o prefeito, o responsável pelo suposto vazamento seria o ministro João Otávio de Noronha, então relator da Operação Maet — deflagrada em dezembro de 2010, que resultou no afastamento de quatro desembargadores acusados de venda de sentenças no Tribunal de Justiça do Tocantins.
“Esse Noronha, há 15 ou 18 anos, ele me chamou em Brasília e falou para mim: ‘Siqueira, só para avisar ao teu pai que vão ser afastados quatro desembargadores’”, disse Eduardo Siqueira, referindo-se ao ex-governador José Wilson Siqueira Campos, seu pai.
O ministro, por sua vez, negou qualquer relação com o episódio. Em nota enviada à imprensa, Noronha afirmou que não participou de qualquer reunião envolvendo o prefeito ou o advogado Thiago Barbosa, e que não mantém relações pessoais ou profissionais com ambos. Atualmente, o magistrado é relator da Operação Maximus, que também investiga a venda de decisões no TJ-TO.
Investigação em cursoAs declarações de Eduardo Siqueira vieram à tona após a apreensão do celular de Thiago Barbosa, sobrinho do atual governador de Tocantins, Wanderlei Barbosa (Republicanos). De acordo com a PF, Thiago teria alertado o desembargador Helvécio de Brito Maia Neto, investigado por envolvimento no esquema de venda de decisões, sobre a operação policial semanas antes de ela ocorrer, em 28 de junho de 2024.
A partir desse episódio, os investigadores solicitaram ao Supremo Tribunal Federal (STF) a prisão de Thiago e a apreensão de seu celular, alegando a necessidade de descobrir como ele teve acesso à informação sigilosa. O advogado foi preso em 18 de maio.
No aparelho, os investigadores encontraram uma série de áudios, entre eles o do prefeito Eduardo Siqueira relatando o suposto aviso de Noronha em 2010. A gravação foi feita em junho de 2024, dois dias antes do alerta ao desembargador Helvécio.
Na ocasião da conversa, Eduardo Siqueira estava em campanha pela prefeitura de Palmas. Os indícios levantaram suspeitas de que o prefeito seria uma das fontes de vazamento de informações estratégicas do STJ. A descoberta foi decisiva para que o ministro Cristiano Zanin, do STF, autorizasse buscas contra o gestor municipal.
A 9ª fase da Operação Sisamnes foi deflagrada na última sexta-feira (30), e resultou na apreensão do celular do prefeito.
Contradições e negaçõesEm entrevista coletiva concedida no mesmo dia da operação, Eduardo Siqueira negou qualquer envolvimento com membros do STJ.
“Só sei o que dizem por aí. Eu não tenho nenhuma informação privilegiada; estou aqui para responder em relação ao fato do suposto vazamento de informação”, declarou.
Entretanto, os autos do megainquérito em curso apontam o contrário. Em outro trecho de áudio, o prefeito afirma ter uma fonte dentro do STJ, que supostamente seria remunerada para repassar dados confidenciais.
“Aqui vão dançar dois juízes e pelo menos três advogados”, antecipou.
Esquema complexo
A Operação Sisamnes, da qual o episódio faz parte, desmantelou uma organização criminosa envolvida em espionagem ilegal e assassinatos por encomenda. A PF encontrou tabelas com valores atribuídos à vigilância clandestina de autoridades dos Três Poderes, incluindo os ministros do STF Alexandre de Moraes e Cristiano Zanin.
O caso segue em investigação e deve se desdobrar em novas fases à medida que o material apreendido for analisado pelas autoridades. A possível responsabilização de autoridades de alto escalão, como ministros e prefeitos, aumenta a gravidade do escândalo.