Parlamentares da oposição ameaçaram articular um pedido de impeachment contra o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, durante uma audiência da Comissão de Relações Exteriores (Creden) na Câmara dos Deputados, nessa quarta-feira (28). A insatisfação dos deputados gira em torno da condução da política externa brasileira, especialmente em episódios recentes envolvendo a América Latina.
Durante a sessão, os parlamentares cobraram explicações sobre o asilo concedido à ex-primeira-dama do Peru, Nadine Heredia, e sobre a fuga de opositores do regime de Nicolás Maduro que estavam sob proteção do governo brasileiro na embaixada da Argentina na Venezuela. Os deputados consideraram a atuação do Itamaraty nesses casos como politicamente motivada e incompatível com a neutralidade diplomática que esperam do Brasil.
A audiência foi marcada após o ministro faltar à convocação anterior, no dia 6 de maio, justificando a ausência pela participação na comitiva do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em viagem oficial à Rússia. A expectativa da Creden era que Vieira prestasse esclarecimentos sobre os episódios que têm causado incômodo entre os parlamentares.
A ausência do ministro Mauro Vieira na reunião anterior provocou duras críticas por parte do deputado federal Marcel van Hattem (Novo), que chegou a acusá-lo de crime de responsabilidade. Diante disso, o parlamentar anunciou a intenção de protocolar um pedido de impeachment contra o chanceler, alegando o cometimento de infrações político-administrativas por parte da autoridade.
“O senhor é um criminoso, sob o ponto de vista de crime de responsabilidade”, disse van Hattem ao apontar que Vieira não compareceu à audiência, marcada para às 14h daquele dia, sendo que o ministro embarcou para a Rússia somente a noite. “Vossa excelência não assume o crime cometido, e vai ter que pagar por ele, seja via Mesa [diretora], seja via Partido Novo, porque nós ingressaremos, se a Mesa não tomar atitude, com um pedido do seu impeachment”.
Em sua justificativa, Mauro Vieira afirmou que dedicou grande parte do dia 6 de maio — data originalmente marcada para a audiência — aos preparativos da viagem da comitiva brasileira a Moscou.
“Não desrespeitei essa comissão”, disse o ministro das Relações Exteriores do Brasil. “Tive muitos despachos no dia 6, ocupado o dia inteiro com reuniões e preparando visita do presidente Lula à Rússia. Não tinha condições de vir”.
Caso Nadine
O asilo diplomático concedido à ex-primeira-dama do Peru, Nadine Heredia, condenada por lavagem de dinheiro, dominou boa parte das quase sete horas de audiência na Comissão de Relações Exteriores. A oposição centrou suas críticas nas circunstâncias da chegada de Heredia ao Brasil, questionando a legalidade e a motivação da medida.
Mauro Vieira, como já havia feito em audiência no Senado na semana anterior, justificou a decisão com base em “urgência humanitária”, alegando que Heredia apresentou problemas de saúde ao solicitar o asilo. O ministro ressaltou ainda que a entrada da ex-primeira-dama no Brasil contou com salvo-conduto emitido pelo governo peruano.
Parlamentares da oposição, no entanto, afirmaram que o Brasil violou a Convenção de Caracas, que estabelece normas para concessão de asilo diplomático. O deputado Filipe Barros (PL-PR), presidente da Creden, argumentou que o artigo 3º do tratado proíbe a concessão de asilo a pessoas formalmente acusadas ou condenadas por crimes comuns.
Veira nega
Mauro Vieira negou qualquer violação à Convenção de Caracas e afirmou não haver infração ao tratado internacional firmado pela Organização dos Estados Americanos (OEA) em 1954. Segundo o ministro das Relações Exteriores, Nadine Heredia solicitou asilo antes da emissão formal da sentença condenatória.
A versão apresentada por Vieira é respaldada por informações do Poder Judiciário do Peru. Embora a decisão condenatória tenha sido divulgada em 15 de abril — um dia antes da chegada de Heredia ao Brasil — a leitura completa da sentença só ocorreu no final do mês, o que, segundo o governo brasileiro, comprova a legalidade do asilo.
Mesmo após os esclarecimentos prestados pelo chanceler, a Comissão de Relações Exteriores da Câmara pretende acionar a Organização das Nações Unidas (ONU). Antes mesmo da audiência, os deputados já haviam aprovado um requerimento, de autoria de Lucas Redecker (PSDB), solicitando uma investigação da ONU sobre o caso.