O resgate diplomático que trouxe Nadine Heredia, ex-primeira-dama do Peru, ao Brasil gerou questionamentos sobre a transparência do governo federal. A Força Aérea Brasileira (FAB) classificou como confidenciais por cinco anos os dados relativos aos custos da operação, que envolveu uma aeronave oficial para transportá-la de Lima a Brasília.
Heredia, condenada por corrupção no Peru, recebeu asilo diplomático concedido pelo governo Lula em abril. Ela chegou à capital brasileira no dia 16 daquele mês, a bordo de um avião da FAB modelo E-135 Shuttle (VC-99C), acompanhado por seis militares. O transporte foi tratado como operação de caráter reservado, segundo documentos obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI).
Ao ser questionada sobre os gastos, a FAB alegou que as informações são protegidas por envolverem “planos e operações estratégicos das Forças Armadas”. A decisão foi confirmada pelo gabinete do Comando da Aeronáutica, sob liderança do tenente-brigadeiro do ar Marcelo Kanitz Damasceno.
“Os custos operacionais da Força Aérea Brasileira são dados de caráter reservado, com prazo de restrição de acesso reservado, conforme o inciso III do § 1º do art. 24 da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011. A informação foi classificada conforme o inciso VI do art. 23 da mesma lei”, diz o posicionamento oficial.
A justificativa para o transporte foi dada pelo ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira. Segundo ele, a operação atendeu a razões humanitárias.
“A única forma que havia de retirá-la com segurança e rapidez do país”, explicou o ministro, destacando que houve anuência do governo peruano.
Vieira também afirmou que a condição de saúde da ex-primeira-dama e a situação de seu filho menor de idade motivaram a urgência no deslocamento.
“A senhora Heredia foi submetida a uma cirurgia grande e grave recentemente, relacionada à coluna cervical, e está em recuperação. Ela também tem um filho menor de idade, que ficaria desassistido, tendo em vista que seu marido está detido”, disse o chanceler, durante audiência com senadores em maio.
O caso reacendeu críticas da oposição, que questiona a prioridade dada ao resgate da peruana, condenada por corrupção, enquanto cidadãos brasileiros em situações de emergência no exterior enfrentam dificuldades para obter ajuda do governo. Um dos episódios que gerou revolta foi o de Juliana Marins, brasileira que morreu ao cair de uma trilha na Indonésia. O governo informou que não arcaria com os custos para repatriar seu corpo.
“Não há base legal nem dotação orçamentária para o Estado custear traslados”, declarou o Itamaraty, citando o Decreto nº 9.199/2017, que restringe a assistência consular a emergências específicas, sem incluir o pagamento de funerais ou hospitalizações no exterior — salvo exceções de caráter humanitário.
Para críticos, a operação que envolveu Heredia — que alega sofrer perseguição política — levanta um debate sobre os critérios utilizados pelo governo na concessão de apoio internacional e sobre a falta de transparência em ações que envolvem recursos públicos.
Heredia é esposa do ex-presidente peruano Ollanta Humala (2011–2016). Ambos foram condenados em abril a 15 anos de prisão por lavagem de dinheiro ligada ao escândalo da Odebrecht e ao financiamento do governo venezuelano.