Anderson Torres afirmou que o Ministério da Justiça não tinha dados técnicos que apontassem irregularidades nas urnas em 2022
Em um depoimento marcado por contradições e questionamentos, o ex-ministro da Justiça do governo Bolsonaro, Anderson Torres, confirmou à Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) que a pasta não possuía qualquer evidência concreta de fraudes no sistema eleitoral após as eleições de 2022.
“No âmbito do Ministério da Justiça propriamente dito — sem ser através da Polícia Federal — não temos setor, nem área nenhuma que trabalhe com essa questão de urnas eletrônicas […]. Tecnicamente falando, não temos nada que aponte fraude nas urnas. Nunca chegou essa notícia até mim”, declarou Torres, em resposta aos questionamentos do ministro Alexandre de Moraes.
O ex-ministro, que hoje responde como réu no processo sobre a tentativa de golpe após a derrota de Jair Bolsonaro, insistiu que suas falas sobre possíveis vulnerabilidades no sistema eleitoral se referiam apenas a “sugestões de melhorias”, e não a indícios de fraude.
“Indício é um termo técnico”: Moraes pressiona
O ministro Alexandre de Moraes lembrou que, em uma reunião ministerial, Torres chegou a mencionar possíveis indícios de hackeamento no sistema eleitoral. Questionado se havia de fato qualquer prova, o ex-ministro recuou:
“Exatamente eu, ministro, eu não tinha […]. São só colocações pessoais minhas ali na reunião”, respondeu.
Moraes, no entanto, destacou que o termo “indício” tem peso jurídico: “O senhor é delegado da Polícia Federal, e o senhor sabe que indício é um termo técnico para início de provas. O senhor tinha algum indício de fraude às urnas?”
A resposta de Torres foi negativa.
O “núcleo crucial” do golpe e os próximos depoimentos
Torres foi o quarto integrante do chamado “núcleo crucial” do suposto golpe a depor no STF. Antes dele, foram ouvidos:
- Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e delator do caso, que confirmou a existência da “minuta do golpe” e disse que o ex-presidente pediu um relatório “duro” contra as urnas;
- Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin, que negou ter monitorado autoridades ou entregado a Bolsonaro documentos questionando as eleições;
- Almir Garnier, ex-comandante da Marinha.
Ainda devem prestar depoimento:
- Augusto Heleno (ex-GSI);
- Jair Bolsonaro;
- Paulo Sérgio Nogueira (ex-Defesa);
- Walter Braga Netto (ex-ministro e vice na chapa de 2022).
Fase final do processo
Os interrogatórios marcam a reta final da instrução processual, etapa em que são colhidas provas antes do julgamento. Após os depoimentos, as partes terão 15 dias para apresentar alegações finais. Em seguida, o caso será levado à Primeira Turma do STF para decisão.
Enquanto os réus tentam se defender, as declarações de Torres reforçam uma tese central da acusação: não havia bases técnicas para as alegações de fraude eleitoral – apenas uma narrativa construída para justificar medidas antidemocráticas.
O julgamento promete reacender o debate sobre os ataques às instituições após as eleições de 2022. E, desta vez, com os principais envolvidos tendo que responder perante a Justiça.