Manter a saúde bucal em dia pode trazer benefícios que vão muito além de um sorriso bonito. Uma nova pesquisa publicada na revista Neurology, da Academia Americana de Neurologia, revela que problemas como cáries e doenças na gengiva estão associados a um aumento de até 86% no risco de AVC isquêmico.
O estudo acompanhou mais de 5 mil adultos, com idade média de 63 anos, que não tinham histórico de AVC. Ao longo de 20 anos, 10% dos participantes que apresentavam simultaneamente cáries e doença periodontal tiveram um AVC, comparado a apenas 4% entre aqueles com boa saúde bucal.
Além disso, a má saúde oral também foi relacionada a um risco 36% maior de infartos e outros problemas cardiovasculares.
Segundo o dentista Cristiano Demartini, CEO da Odontotop, a explicação está nos processos inflamatórios desencadeados na boca, que podem atingir todo o organismo.
“Esse estado inflamatório prolongado contribui para o estreitamento das artérias e alterações na função vascular, fatores reconhecidos como gatilhos para doenças cardíacas e cerebrovasculares”, explica.
Ele destaca que a doença periodontal, por ser uma inflamação crônica, facilita a entrada de bactérias na corrente sanguínea. Essas bactérias podem estimular o desenvolvimento da aterosclerose — acúmulo de placas nas artérias — aumentando o risco de infarto e AVC. “A boca se torna um verdadeiro marcador da saúde geral, revelando riscos que vão além do consultório”, completa.
A pesquisa também mostrou que visitas regulares ao dentista têm efeito protetor. Pacientes que mantinham o acompanhamento odontológico tinham 81% menos chance de apresentar a combinação de gengivite e cáries, e 29% menos chance de desenvolver apenas doença gengival.
O cuidado deve ser redobrado para pessoas com histórico familiar de doenças cardíacas ou com fatores de risco como diabetes e hipertensão.
“Higiene bucal adequada, diagnóstico precoce e tratamento correto reduzem significativamente a inflamação na cavidade oral, diminuindo a liberação de substâncias inflamatórias e prevenindo alterações vasculares silenciosas”, afirma Demartini.
A relação entre saúde bucal e doenças sistêmicas não é nova. Pesquisas anteriores já indicaram que bactérias da boca podem aumentar o risco de ataques cardíacos e estão associadas a quadros graves de aterosclerose.
Além disso, estudos têm apontado conexões entre doenças periodontais e condições neurológicas. Em 2019, uma pesquisa publicada na Science Advances encontrou a bactéria Porphyromonas gingivalis — responsável pela periodontite — no cérebro de pacientes com Alzheimer. Outro estudo, publicado na Nature em 2021, relacionou a doença periodontal ao Parkinson, possivelmente devido à inflamação causada por bactérias orais.
“Essas associações continuam sendo investigadas, mas a relação entre saúde bucal e saúde neurológica está cada vez mais evidente”, afirma a cirurgiã-dentista Bruna Conde.

