O cenário de coqueiros e praias cristalinas que tornou a Rota dos Milagres um dos destinos mais badalados do Brasil hoje também esconde uma face sombria: o litoral norte de Alagoas virou alvo direto do Comando Vermelho, que vem expandindo suas operações para controlar o tráfico de drogas na região. Essa presença tem deixado um rastro de jovens desaparecidos e famílias destruídas, em meio à beleza que atrai celebridades e turistas com alto poder aquisitivo.
O aumento do fluxo de dinheiro trazido pelo turismo criou um ambiente propício para a facção criminosa, que aproveitou para recrutar moradores, consolidar pontos de venda de drogas e impor medo. “O tráfico de drogas tem expandido suas ações na Rota dos Milagres, no Norte de Alagoas, localidade de grande fluxo turístico e circulação de dinheiro. Nessa região, próspera e violenta, as facções criminosas são acusadas de executar moradores e esconder os corpos das vítimas, a maioria jovens”, aponta o relatório da Polícia Civil.
A escalada do Comando Vermelho na região foi acompanhada por um aumento de execuções e desaparecimentos. De fevereiro a maio, quatro jovens sumiram em sequência — Guilherme Santos de Almeida Lima (21), Pedro Willian dos Santos Silva (26), João Victor Pinto (18) e Eduardo dos Santos (20) — todos moradores que, segundo a polícia, podem ter sido mortos a mando da facção, como forma de punir dívidas de drogas ou suspeitas de traição.
Para a Polícia Civil, os casos têm a marca do Comando Vermelho: execuções seguidas da ocultação dos corpos em matas fechadas para evitar que os homicídios sejam descobertos e registrados oficialmente. Delegados reforçam que essa estratégia visa dificultar investigações e garantir o controle do tráfico pelo terror psicológico imposto às comunidades.
No dia 16 de junho, uma ossada foi encontrada em uma área de mata em São Miguel dos Milagres. A suspeita é de que pertença a um dos jovens desaparecidos, mas ainda não houve identificação oficial. O achado ocorreu após intensas buscas, motivadas justamente pela sequência de desaparecimentos ligada ao avanço da facção na região.
A morte de Cícero Batista dos Santos da Silva, o “Coroa Tito”, em 18 de junho, marcou um momento decisivo na tentativa de conter o domínio do Comando Vermelho na Rota dos Milagres. Ele era apontado como principal líder da facção no litoral norte e responsável direto por ordenar execuções. Seu segurança, conhecido como “Peluxo”, também morreu em confronto com a Polícia Militar. A operação foi coordenada pela Secretaria de Estado da Segurança Pública, que investiga se Tito organizava o assassinato dos jovens desaparecidos.
De acordo com o delegado Sidney Tenório, as ações do Comando Vermelho têm como característica a eliminação de desafetos e a ocultação dos corpos para dificultar a elucidação dos crimes: “Sem corpo, acaba que os primeiros registros ficam como desaparecimento de pessoa. E isso acaba atrasando os levantamentos iniciais de homicídio”, explicou. Já o delegado Ronilson Medeiros ressalta que, além de ser uma tática para proteger o tráfico, essa prática destrói emocionalmente as famílias, que vivem na incerteza sobre o destino dos filhos.
Um policial militar que atua na região confirmou que a facção usa extrema violência para impor medo e cobrar dívidas: “Eles acabam assassinando e escondendo os corpos em áreas de difícil acesso para que não sejam encontrados. Dessa forma, fica mais complicado identificar e descobrir a causa da morte”, relatou, pedindo anonimato.
Enquanto as autoridades tentam frear a expansão do Comando Vermelho, a angústia toma conta das famílias que buscam, ao menos, a chance de enterrar seus filhos e ter um mínimo de paz. A Rota dos Milagres segue, assim, dividida entre o glamour do turismo e o terror silencioso imposto pela facção criminosa que transformou o paraíso em território de medo.