A votação da chamada PEC da Impunidade foi adiada na Câmara dos Deputados após um dia marcado por confusão, pressão política e críticas à condução dos trabalhos. A proposta visa alterar as regras de imunidade parlamentar, mas enfrentou resistência devido à apresentação de textos inacabados pelo relator Lafayette de Andrada, o que impediu qualquer possibilidade real de apreciação ainda na madrugada de terça (27) para quarta-feira (28).
A ausência de um parecer consolidado foi apontada por líderes partidários como o principal entrave para a votação. Embora houvesse a intenção de avançar com o tema, a falta de um documento formal, até mesmo próximo das 20h de terça-feira, frustrou os planos. Alguns deputados acreditam que, se Lafayette tivesse ao menos protocolado uma versão preliminar, haveria espaço para tentativa de votação. Para eles, o episódio evidenciou uma articulação apressada e desorganizada.
Nos bastidores, a principal tensão girou em torno da pressão exercida pelo centrão. Parte dos parlamentares buscava incluir na proposta dispositivos que permitiriam à Câmara autorizar previamente a abertura de inquéritos contra deputados, ou até mesmo sustar investigações em andamento. Essa versão alternativa foi apelidada de “texto B” e provocou indignação dentro e fora da base governista.
Uma das manobras mais polêmicas discutidas foi a tentativa de votar a PEC com voto secreto. A ideia era reduzir o custo político dos parlamentares que apoiariam a proposta de blindagem. No entanto, regimentalmente, essa possibilidade enfrenta forte barreira: a Constituição exige votação em dois turnos com quórum qualificado de 3/5 e a prática na Câmara é a votação nominal. Qualquer tentativa de sigilo seria, portanto, passível de judicialização imediata.
A movimentação do centrão também foi vista como parte de uma estratégia mais ampla. Parlamentares apontam que a tentativa de controle interno sobre investigações estaria ligada a outra proposta: a PEC que extingue o foro privilegiado. O objetivo seria criar uma blindagem dupla — ao mesmo tempo em que dificulta a abertura de processos na Câmara, transferir ações para instâncias superiores, mais lentas e menos propensas à atuação rápida da Justiça comum.
Para a deputada Talíria Petrone (PSOL-RJ), o adiamento representou uma vitória para a democracia. Ela afirmou que as sugestões discutidas nos bastidores colocavam em risco o equilíbrio institucional, ao propor que o Legislativo assumisse funções próprias do Judiciário. “O que estava em jogo era mais do que prerrogativas parlamentares; era uma tentativa de institucionalizar a impunidade”, declarou.
PEC da Impunidade: ‘salvo-conduto institituconal’
A condução desorganizada da proposta também despertou críticas entre partidos que, geralmente, não compartilham posições em temas institucionais. O PSD, por exemplo, se distanciou de sua postura tradicional e se uniu ao PT e a outras legendas da esquerda para questionar tanto o conteúdo quanto o trâmite da PEC. A leitura entre parlamentares da base governista é de que o presidente da Câmara, Hugo Motta, tentou repetir a tática usada por Arthur Lira em 2021 com a PEC do voto impresso: levar o tema à pauta sem ter votos suficientes, apenas para desmobilizar pressões. No entanto, a retirada da PEC sem qualquer votação ou simbolismo foi considerada ainda mais caótica, mantendo a proposta em evidência.
Internamente, o relator Lafayette de Andrada demonstrou desconforto com a crescente interferência do centrão no conteúdo da PEC. De acordo com relatos de bastidores, ele teria sinalizado incômodo com tentativas de inserir dispositivos que transformariam a proposta em um verdadeiro escudo institucional para parlamentares. Essa insatisfação contribuiu para a ausência de um parecer formal até o fim da noite, o que travou qualquer possibilidade de avanço da matéria.
Na oposição, o movimento é oposto. Lideranças estão se articulando para garantir que o tema retorne à pauta em breve. A expectativa é de que o colégio de líderes da próxima semana volte a discutir a proposta e defina se e quando ela será reapresentada ao plenário. A avaliação de parte da oposição é que, mesmo sem consenso, não se pode deixar o tema sair do radar político.
Enquanto isso, o relator segue sob pressão. A tarefa de apresentar um texto final que contemple os interesses divergentes entre centrão, governo e oposição é considerada delicada. As exigências de líderes de partidos de centro-direita, a resistência firme da esquerda e os recuos do próprio relator revelam um cenário ainda sem rumo claro.
O desenrolar da PEC da Impunidade, até agora, tem exposto divisões profundas no Congresso. A proposta, que poderia unir bancadas em torno de interesses corporativos, acabou se tornando um símbolo das tensões internas da Casa e da dificuldade em estabelecer acordos mínimos mesmo em pautas de blindagem parlamentar.








 
			 
			




