A arquiteta brasileira Daniela Marys de Oliveira, de 35 anos, está presa há sete meses na Prisão Provincial de Banteay Meanchey, no Camboja. A família relata que ela foi vítima de um esquema internacional e levada ao país asiático com uma falsa proposta de emprego na área de telemarketing.
O que parecia ser uma oportunidade temporária acabou se tornando um pesadelo. O contrato prometido tinha duração de seis meses a um ano, e a ideia de Daniela era retornar ao Brasil após esse período. Ela viajou ao Camboja no dia 30 de janeiro, mas ao chegar lá, foi surpreendida com a exigência de participar de atividades ilegais.
Segundo os relatos dos familiares, ao desembarcar no país, Daniela teve seu passaporte confiscado e foi levada para um local isolado, longe da capital. O complexo em que ficou retida não tinha acesso a comércio, estrada ou qualquer estrutura básica, o que impossibilitava sua saída.
Ainda de acordo com a família, a brasileira se recusou a colaborar com os crimes virtuais exigidos, o que pode ter contribuído para sua prisão. Desde então, ela permanece detida, aguardando uma solução para seu caso.
Tráfico internacional de pessoas
Assim como já ocorreu com outros brasileiros, Daniela Marys de Oliveira pode ter sido alvo de uma rede internacional de tráfico humano. Essas organizações atuam principalmente no Sudeste Asiático, onde mantêm complexos controlados por máfias locais que exploram estrangeiros para a prática de crimes virtuais.
Conforme relatado pela família, quando Daniela se recusou a participar dos golpes e pediu para sair da função imposta, foi informada de que teria que pagar uma multa. Logo após esse episódio, os familiares denunciam que drogas teriam sido plantadas em sua bagagem — o que resultou na prisão da arquiteta.
O julgamento da brasileira está marcado para o dia 23 de outubro, quando ela deverá responder por posse e uso de drogas. As autoridades locais, até o momento, não revelaram quais substâncias teriam sido supostamente encontradas com ela.
Além disso, os familiares enfrentaram um novo golpe logo após a prisão. Nos dois dias seguintes à detenção de Daniela, criminosos se passaram por sua irmã para extorquir a família. Cerca de R$ 27 mil foram transferidos aos golpistas.
O único contato direto entre Daniela e a família ocorreu em 29 de março. Na ocasião, ela explicou parte do que havia vivido, relatando que pediu para realizar um teste toxicológico — solicitação que foi negada. Sem falar o idioma local, a arquiteta enfrenta dificuldades dentro da prisão, mas uma ONG conseguiu providenciar um advogado para acompanhá-la no julgamento.
Para ajudar nos custos legais, nas passagens e na compra de itens básicos, a família iniciou uma vaquinha virtual com a meta de arrecadar R$ 60 mil. O valor será usado para tentar viabilizar o retorno da brasileira ao país e oferecer o suporte necessário.
Em nota oficial, o Itamaraty afirmou que acompanha o caso por meio da Embaixada do Brasil em Bangkok. O órgão informou que está prestando a assistência consular cabível, conforme prevê o Protocolo Operativo Padrão de Atendimento às Vítimas Brasileiras do Tráfico Internacional de Pessoas.
Prisão superlotada
Daniela está há sete meses detida na Prisão Provincial de Banteay Meanchey, no norte do Camboja. A unidade é conhecida por sua estrutura precária, superlotação crônica e relatos de negligência, como inundações e mortes entre os detentos.
Segundo o site Camboja News, a prisão enfrenta uma “superlotação severa” e sérios atrasos em atendimentos médicos. Em março, um desses atrasos culminou na morte de um prisioneiro, evidenciando as condições críticas do local.
Um dos casos mais recentes foi o de Leap Chantha, de 22 anos, preso em dezembro de 2023 por posse e transporte ilegal de armas, roubo, violência e uso de drogas. Sentenciado a três anos, ele já havia cumprido um ano e dois meses quando faleceu na unidade.
Embora tenha recebido atendimento médico antes de morrer, Chantha foi vítima de um problema cardíaco e falta de oxigenação cerebral. A família afirmou que não foi informada imediatamente sobre o ocorrido e criticou a gestão da prisão. Segundo o pai do jovem, ele já havia reclamado das condições insalubres e da superlotação.
Dados do Licadho, organização cambojana de defesa dos direitos humanos, indicam que várias prisões no país operam com até 200% de sua capacidade, agravando os riscos à saúde e segurança dos detentos.
Em 2013, uma grave enchente forçou a evacuação de 842 presos da Banteay Meanchey. As chuvas intensas e o transbordamento do rio Mekong fizeram com que o nível da água chegasse até o pescoço dos prisioneiros em algumas áreas da unidade. Naquele ano, as enchentes deixaram 104 mortos e afetaram cerca de 1,5 milhão de pessoas em apenas três semanas.