O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, participou em maio de ao menos seis eventos organizados ou financiados por empresários e instituições com interesses diretos em processos que tramitam na Corte. A agenda, que incluiu viagens internacionais e encontros em ambientes privados, reacendeu o debate sobre a relação entre magistrados e partes interessadas em ações sob julgamento.
Entre os compromissos do ministro, esteve um jantar beneficente promovido pelo CEO do iFood, Diego Barreto, que chamou atenção por reunir empresários, autoridades e juristas. Em vídeo que circulou nas redes sociais, Barroso aparece cantando ao microfone ao lado do anfitrião. O evento, segundo os organizadores, teve como objetivo arrecadar recursos para o Programa de Ação Afirmativa para Ingresso na Magistratura, iniciativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) voltada à inclusão de negros e indígenas na carreira judicial.
O iFood é parte interessada em uma ação no STF que discute a existência de vínculo empregatício entre motoristas de aplicativo e empresas de tecnologia, processo considerado de repercussão geral. A participação de Barroso no evento levantou questionamentos sobre possíveis conflitos de interesse.
Em nota, o STF afirmou que a atuação de seus ministros em eventos públicos e privados tem como objetivo promover o diálogo com diversos setores da sociedade, incluindo advogados, empresários, jornalistas e lideranças sociais. “Dialogar com as partes de um processo não gera conflito de interesses”, argumentou o tribunal.
Além do jantar com o CEO do iFood, Barroso também esteve presente em Nova York, onde participou de três eventos, incluindo um promovido pelo jornal Valor Econômico, patrocinado pela JBS. A empresa, maior processadora de carnes do mundo, responde a diversos processos no STF, muitos deles decorrentes da Operação Lava Jato e de acordos de leniência firmados com órgãos de controle. Um dos irmãos Batista, sócios da JBS, acompanhou o evento.
O presidente do Supremo também participou de cerimônias organizadas pela Lide Brasil e pela revista Veja, ambas com patrocinadores envolvidos em ações no STF. Em Brasília, Barroso esteve em uma recepção promovida pela revista GPS na casa de Fernando Cavalcanti, ex-vice-presidente do escritório Nelson Wilians Advogados, que representa dezenas de clientes na Corte.
Segundo o escritório, o evento teve caráter pessoal e não institucional. “Iniciativas de natureza pessoal não se confundem com a atuação institucional do escritório”, declarou a banca em nota.
Fechando a agenda, o ministro palestrou no evento da Confederação Nacional da Indústria (CNI), realizado em Brasília no último dia 26, em comemoração ao Dia da Indústria. A CNI figura como parte em cerca de 30 processos no Supremo, incluindo ações que questionam contribuições previdenciárias adicionais cobradas de empresas.
Diante das críticas, Barroso minimizou os questionamentos sobre sua conduta. “No Brasil existem duas grandes categorias de pessoas: as que fazem alguma coisa e as que têm razão. Portanto, a gente tem que continuar fazendo e deixar parado as que têm razão e precisam vender jornal falando bobagem”, afirmou.
A participação de ministros do STF em eventos com setores diretamente afetados por decisões da Corte tem sido tema recorrente de debate sobre a transparência e a imparcialidade do Judiciário. Apesar das justificativas oficiais, especialistas em ética pública alertam para os riscos de confusão entre funções institucionais e relações pessoais.
