As rachaduras nas paredes e o medo constante de ver suas casas desmoronarem tornaram-se parte da rotina de muitos moradores do Bom Parto, em Maceió. Agora, novos dados apresentados pela Defensoria Pública do Estado de Alagoas confirmam que a situação é ainda mais grave: o solo está cedendo em ritmo acelerado, principalmente na região sudoeste do bairro.
Esses estudos, segundo o defensor público Ricardo Melro, revelam taxas alarmantes de subsidência, chegando a mais de 50 milímetros de rebaixamento do solo por ano em alguns pontos. “O bairro Bom Parto está afundando, e os próprios dados de origem oficial, processados de forma independente, comprovam isso. Todos os setores que estão na criticidade 01 já deviam estar como 00, desde dezembro de 2024”, destacou Melro.
Diante das evidências, a Defensoria pretende acionar a Justiça para que o mapa de risco da área seja atualizado, garantindo que todas as residências ameaçadas – inclusive as que hoje estão nas bordas da zona de perigo – sejam incluídas no plano de evacuação, com direito à indenização e compensação por danos morais.
O caso de dona Maria Socorro da Silva ilustra a gravidade do problema. Moradora da rua General Hermes, ela precisou abandonar a casa que serviu de lar para sua família por anos, depois que rachaduras profundas tornaram impossível morar com segurança no imóvel. Apesar de uma vistoria feita pela Defesa Civil em 2021 ter confirmado as avarias e recomendado isolamento de cômodos essenciais, como banheiro e cozinha, nenhuma interdição oficial foi realizada até hoje.
Para piorar, a ajuda oferecida pelo município se mostrou ineficaz. Segundo dona Socorro, a única proposta foi um aluguel social de R$ 200, valor que ela considerou insuficiente para arcar com uma moradia digna em outra região. “A assistente social perguntou se queríamos que ela nos cadastrasse no aluguel social, que era de 200 reais. Perguntei se era piada. Ela disse ‘infelizmente não’. Por isso, preferimos não aceitar esse tipo de ajuda”, contou à reportagem.
A nova análise técnica, que compara medições de dezembro de 2024 com dados acumulados desde 2018, evidencia que a situação do Bom Parto se deteriora ano após ano. E o que mais preocupa, segundo Melro, é que áreas já gravemente afetadas continuam sem qualquer classificação oficial de risco no último Mapa de Criticidade (versão 5).
Ainda assim, a Defesa Civil de Maceió afirma que monitora permanentemente as regiões identificadas como críticas, mas evita interditar imóveis para não “criar precedentes”, apesar de reconhecer o agravamento das fissuras. O Comitê de Acompanhamento Técnico (CAT) reforça que mesmo pontos com afundamento intenso seguem apenas sob observação.
Para mudar esse cenário, a Defensoria Pública ingressou com duas ações civis públicas: uma focada no Bom Parto, outra pedindo o retorno do Serviço Geológico do Brasil (SGB/CPRM) à capital alagoana, com a missão de atualizar presencialmente os estudos sobre a subsidência. A expectativa é que o SGB confirme os dados levantados e que a Justiça determine a elaboração de um novo Mapa de Criticidade, mais preciso, que permita a realocação segura das famílias.
Enquanto isso, casos como o de dona Socorro permanecem em limbo. A advogada dela, Michele Gusmão, afirma que a família aguarda uma proposta da Braskem para reparação dos danos, mas que, até agora, não houve qualquer sinalização. A defensora acredita que a iniciativa coletiva da Defensoria possa ser um caminho para garantir justiça a todos os moradores atingidos pelo desastre.