“Eu não apoiava o que ele fazia, mas ele tinha o direito de se entregar, de estar preso”. O desabafo é de Tauã Brito, de 36 anos, mãe de Wellington, de 20 anos, um dos 121 mortos na Operação Contenção, ação policial realizada na última terça-feira (28) nos complexos da Penha e do Alemão, no Rio de Janeiro, e considerada a mais letal da história do estado.
Ela afirma que o filho foi encontrado com os punhos amarrados, um corte de faca no braço e um tiro na cabeça, o que indicaria execução depois de já estar rendido.
“Se um policial conseguiu chegar no meu filho, amarrar o braço dele e dar uma facada nele, é porque ele não oferecia mais perigo. Então, por que não levou preso? No Brasil, não tem pena de morte. Se a pessoa não oferece perigo, tem que ser presa”, criticou, relatando que tem recebido diversas ofensas por denunciar o que aconteceu.
Tauã conta que, desde 2h da madrugada, trocou mensagens com o jovem, pedindo que ele ficasse em casa. Ela enviou salmos e insistiu para que ele não saísse, mas Wellington acabou indo para a mata da Serra da Misericórdia, onde, segundo a mãe, policiais do Bope criaram um “muro”, impedindo tanto a retirada de quem estava lá quanto a entrada de moradores.
Diante do silêncio do filho, ela tentou alcançá-lo, sendo impedida por policiais. À noite, já no Hospital Estadual Getúlio Vargas, pediu que a imprensa ajudasse a entrar na mata sem risco de ser baleada, o que não ocorreu. Mais tarde, após a saída de agentes, ela e o pai de Wellington subiram com a luz do celular, chamando por ele, e o encontraram por volta de 1h da manhã, junto a outros corpos.
O velório ocorreu durante a madrugada e a manhã de quarta-feira (29), no mesmo momento em que moradores retiraram 80 mortos da mata e os colocaram enfileirados na Praça São Lucas, lembrando a Chacina de Vigário Geral, que deixou 21 vítimas há três décadas.
“O governador [do Rio, Cláudio Castro] disse que essa foi uma operação bem-sucedida. Bem-sucedida para quem? O que mudou aqui dentro? A plataforma política dele é essa: oferecer corpos?”, questionou. Ela afirma que, enquanto cobra medidas que deem oportunidade aos jovens da favela, presenciou agentes rindo e debochando das famílias na porta do IML: “A gente viu dois ônibus da polícia debochando das famílias, rindo, batendo palma, dando gargalhada”.
Outro ponto denunciado é o tratamento dos corpos. Segundo ela, ficaram por horas no sol, tanto na mata quanto no IML, onde teriam permanecido no chão até o início do atendimento. Tauã acredita que deveriam ter sido enviados para outras unidades, com mais respeito. Por causa do avançado estado de decomposição, o enterro teve de ser com caixão fechado. “Eu queria ver o meu filho, me despedir, mas teve de ser com caixão fechado. Eu pedi para abrir, só que, quando abriu, pedi para fechar”.
A confeiteira afirma que ainda não conseguiu retornar para casa e que seguirá falando para evitar que outras mães percam seus filhos. “A minha guerra acabou, mas tem muitas mães pedindo socorro para seus filhos, e minha luta será por eles também”. Ela reforça: “Eu quero falar, realmente, sobre a minha dor, sobre o que aconteceu naquele dia, sobre o direito que me foi tirado, de chegar ao meu filho para ele poder ser preso, porque, daqui a pouco, isso vai estar esquecido, mas existem outros Wellingtons e mães que precisam ouvir”.
O governo do Rio sustenta que a ação foi bem-sucedida. Autoridades alegam que os mortos foram os que atiraram contra os policiais, que atuavam no cumprimento de 100 mandados de prisão e 180 de busca e apreensão. O objetivo, segundo eles, foi deslocar o confronto para a área de mata, considerada o “quartel general do Comando Vermelho”, para preservar moradores.
O governador Cláudio Castro declarou que apenas os quatro policiais mortos seriam vítimas da operação. O secretário de Polícia Civil, Felipe Curi, afirmou: “Chacina é a morte ilegal. O que fizemos ontem foi ação legítima do Estado para cumprimento de mandados de apreensão e prisão”.
Organizações de direitos humanos e movimentos de favelas classificaram o episódio como “chacina” e “massacre” e cobram investigação independente.








			
			




