Uma jovem que passeava por um shopping center em Londres teve a vida completamente transformada após ser atingida por um homem que se jogou do terceiro andar. O impacto deixou a vítima gravemente ferida e marcou o início de uma nova e inesperada trajetória. A história é contada em um episódio da quarta temporada do podcast Que História!, da BBC News Brasil, disponível nas principais plataformas de streaming.
“É como se nós fossemos duas partículas”, disse a jovem mulher ao contar sua história à BBC. “Eu estava seguindo um caminho, nós colidimos e de repente eu segui por uma jornada completamente diferente”, afirma Grace Spence Green.
Em 2018, aos 22 anos, Grace vivia a realização de um desejo que cultivava desde criança: estudava Medicina na Inglaterra e já havia chegado ao quarto ano da graduação.
“Eu tinha esse livro de medicina quando tinha cerca de sete anos”, contou ela ao programa Life Changing, da BBC. “Era um daqueles em que você podia se diagnosticar e eu fiquei obcecada com isso, em ver como determinados sintomas levavam a determinados diagnósticos.”
Durante a infância, a prática de atividades físicas esteve sempre no centro de sua rotina, ocupando um papel importante em seu dia a dia.
“Acho que tive uma infância maravilhosa, com muitas aventuras. Minha família costumava ir à Turquia e à Austrália. Depois comecei a escalar quando tinha cerca de oito anos e adorei. Isso meio que se tornou uma grande parte da minha identidade. Eu participava de competições de escalada e cheguei a ser campeã juvenil sub-18 em 2012.”
“Era algo em que eu era muito boa e adorava, e também adorava treinar crianças a escalar, o que comecei a fazer quando tinha cerca de 17 anos.”
Filha de acadêmicos que atuavam em universidades, Grace sempre contou com o incentivo da família para seguir seus objetivos. Conquistou uma vaga em Medicina, mas logo descobriu que os primeiros passos na graduação seriam muito mais desafiadores do que imaginava.
“No primeiro ano, tive muita dificuldade em lidar com a quantidade enorme de informações que eu recebia. E acabei falhando em todos os exames no primeiro ano. Foi terrível. Mas acabou servindo como um grande alerta.”
“Passei o verão inteiro estudando em vez de aproveitar as férias, para refazer os exames. E essa experiência me fez ter certeza de que isso era o que mais queria fazer no mundo, medicina, mais do que qualquer outra coisa. E depois desse primeiro ano, não tive muitos obstáculos pelas frente.”
‘Alguém caiu em cima de mim’
A vida de Grace seguia em ritmo positivo: os estudos avançavam, ela começou um relacionamento e, durante o quarto ano da faculdade, passou dois meses estagiando em uma maternidade em Maidstone, no condado de Kent, sul da Inglaterra. Ao final do estágio, aproveitou a carona de uma amiga para viajar até Londres.
“Estávamos voltando para Londres porque naquela noite eu ia ensinar algumas crianças a fazer escalada. E minha amiga queria fazer compras. Então paramos num shopping center. Ela ia fazer compras e eu ia pegar o metrô ali.
Localizado no bairro de Stratford, o shopping Westfield é um dos maiores do Reino Unido. Inaugurado poucos meses antes dos Jogos Olímpicos de Londres, em 2012, o complexo fica ao lado do Parque Olímpico, na região leste da capital inglesa.
“É enorme. E é meio brilhante, brilhante e branco. Essa é a minha principal lembrança disso. Estacionamos e descemos as escadas rolantes. Olhamos um mapa do shopping, por alguns segundos e seguimos andando pelo átrio principal no térreo. Aí eu me despedi de minha amiga, que subiu pela escada rolante.”
“Eu continuei andando com minha bagagem, por alguns segundos. E depois disso, eu só me lembro de, de repente, acordar.”
“Foi a experiência mais surreal e bizarra. É difícil descrever e sensação de acordar quando você pensava que já estava acordada. Especialmente num lugar que nem o shopping center enorme e moderno que é Westfield. Eu olhava para cima e tudo que pude ver era esse tipo de luz branca brilhante, era como se eu estivesse num sonho ou no céu ou algo assim.”
Enquanto caminhava pelo piso térreo do shopping, Grace foi atingida por um homem que se lançou de uma sacada no terceiro andar, cerca de 30 metros acima. Por um infeliz acaso, ela estava exatamente no ponto onde ele caiu.
“Apaguei por cerca de oito minutos. E quando acordei, meu primeiro pensamento foi que eu estava olhando para esse teto branco brilhante. E meu segundo pensamento foi: ‘Oh, meu Deus, eu não consigo sentir minhas pernas’.”
“Eu me lembro de gritar para alguns policiais e outras pessoas ali perto: ‘Não consigo sentir minhas pernas, não consigo sentir minhas pernas’. Eu estava desesperadamente tentando dizer a eles que algo estava errado, que algo estava realmente errado.”
“E nesse momento eu ainda não sabia o que tinha acontecido. Eu só pensava nessa falta de sensação nas pernas. Foi como se elas tivessem deixado de existir. Sabe quando você desconecta um cabo? Parece que eu tinha acabado de ser desconectada de metade do meu corpo.”
“Eu me lembro de estar deitada lá e dessas pessoas falando comigo. E elas dizendo que fui atingida ou algo assim. Me lembro de ter a sensação de que alguém estava perto de mim, deitado no chão. Havia outro grupo de pessoas conversando com outra pessoa no chão. E eu me lembro muito claramente de uma mulher dizendo à pessoa no chão ‘você caiu de uma grande altura’. Então eu acho que, logo no início, eu juntei as peças: alguém caiu em cima de mim”, conta Grace.