Despesas fora das regras fiscais somam R$ 324 bilhões entre 2023 e 2025 e levantam alerta sobre sustentabilidade das contas públicas
Em menos de três anos de gestão, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já ultrapassou a marca de R$ 300 bilhões em gastos públicos extraordinários – ou seja, fora das regras fiscais que deveriam controlar o crescimento das despesas da União. A cifra foi levantada pela Instituição Fiscal Independente (IFI) e revela um volume expressivo de recursos movimentados à margem das metas estabelecidas no novo arcabouço fiscal.
Segundo os dados, os gastos extras devem alcançar R$ 324 bilhões entre 2023 e 2025. Só no primeiro ano do terceiro mandato, 2023, o governo federal já havia usado R$ 241,3 bilhões fora das regras — valor impulsionado pela aprovação da PEC da Transição e pelo pagamento de precatórios que haviam sido adiados pela gestão anterior.
Para este ano, o Ministério da Fazenda prevê R$ 49,3 bilhões em novas despesas fora da meta fiscal, sendo a maior parte referente a novos pagamentos de precatórios. Em 2024, os gastos extraordinários chegaram a R$ 33,8 bilhões.
Mesmo que tenham respaldo legal e não configurem irregularidade, esses valores chamam a atenção pela dimensão e pela frequência com que as exceções têm sido usadas. Economistas e especialistas ouvidos pela imprensa alertam que esse comportamento compromete a credibilidade das regras fiscais recém-aprovadas e afeta a confiança dos investidores.
Ajustes, dívidas e calamidades
Grande parte dos recursos extraordinários utilizados em 2023 vieram com a PEC da Transição, aprovada no fim de 2022, que liberou R$ 145 bilhões para financiar programas sociais como Bolsa Família, Auxílio Gás e Farmácia Popular. Outro destaque foi o pagamento de R$ 92,4 bilhões em precatórios – compromissos judiciais que haviam sido adiados pelo governo anterior.
Em 2024, a principal despesa extraordinária do governo foi a ajuda emergencial ao Rio Grande do Sul, que sofreu com enchentes históricas. Foram R$ 29 bilhões destinados à reconstrução do estado, incluindo obras de infraestrutura e apoio à economia local.
Além disso, entram na conta gastos com o novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), ações de combate a queimadas, apoio à cultura, recomposição de verbas para o Judiciário e renúncia de receitas tributárias.
Regra fiscal questionada
As despesas fora do teto acontecem em meio à implementação do novo marco fiscal, que entrou em vigor este ano e prevê que o crescimento das despesas da União deve ser limitado a 70% da variação da receita do ano anterior, com tetos e pisos definidos. Ainda assim, os mecanismos legais para driblar essas regras vêm sendo constantemente utilizados pelo governo.
“Apesar de não configurarem desvio formal, essas mudanças e flexibilizações repetidas causam temor sobre a sustentabilidade da regra fiscal”, afirmou Pedro Souza, analista da IFI.
A preocupação se estende para os próximos anos. O próprio Ministério do Planejamento já projeta que, em 2026, será necessário reservar cerca de R$ 69,7 bilhões para o pagamento de precatórios – o que pode manter os gastos extraordinários em patamares elevados.
Mais um gasto fora do teto: fraudes no INSS
Além dos R$ 324 bilhões já contabilizados, o governo pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a autorização para excluir das regras fiscais os valores que serão usados para reembolsar aposentados e pensionistas vítimas de descontos indevidos no INSS.
O pedido, feito pela Advocacia-Geral da União (AGU), argumenta que a fraude foi imprevisível e requer crédito extraordinário para agilizar o ressarcimento. A estimativa do Ministério da Previdência é que o valor dos reembolsos possa chegar a R$ 4 bilhões.
Com mais esse possível acréscimo, os gastos do governo Lula fora do arcabouço fiscal podem se aproximar de R$ 330 bilhões antes mesmo do fim do mandato.