Nesta semana, o Brasil assumirá a presidência rotativa do Mercosul, bloco econômico formado por países da América do Sul. A passagem de comando será oficializada durante a Cúpula de Chefes de Estado do Mercosul e Estados Associados, que ocorrerá em Buenos Aires, na Argentina, entre os dias 2 e 3 de julho. O presidente Lula representará o país no encontro, que marca sua primeira visita ao território argentino desde a eleição do presidente Javier Milei, com quem Lula ainda não teve um encontro formal após uma campanha marcada por trocas de farpas.
À frente do bloco, Lula pretende priorizar a conclusão do aguardado acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia, além de promover avanços nos setores automotivo e açucareiro. Segundo o Ministério das Relações Exteriores, o intercâmbio entre os membros do bloco sul-americano movimentou R$ 17,5 bilhões entre janeiro e maio de 2025.
O tratado entre Mercosul e União Europeia é discutido há mais de duas décadas, mas encontrou avanços mais significativos após a chegada de Lula à presidência. Ainda assim, especialistas ouvidos pelo portal Metrópoles avaliam que o processo está longe de ser finalizado, embora haja sinais de progresso, especialmente no campo ambiental.
A professora Lia Valls, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), explicou que o governo de Jair Bolsonaro dificultou o avanço das negociações ao não priorizar pautas ambientais, consideradas cruciais pela União Europeia. “Quando Lula assumiu, foi feito um adendo ao acordo, com novos compromissos ambientais por parte do Brasil e concessões do lado europeu”, afirmou.
No entanto, a questão ambiental continua sendo um dos principais entraves, especialmente entre países como França, Irlanda e Espanha. A França, por exemplo, enfrenta forte pressão de setores agrícolas que temem prejuízos econômicos com o tratado. Embora a agricultura represente uma parcela pequena do PIB francês, o setor possui expressiva força política no país.
O pesquisador Leonardo Paz, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), relembra que o governo de Michel Temer acelerou significativamente as tratativas, mesmo com concessões consideradas desfavoráveis à indústria nacional. Já sob Bolsonaro, além do afastamento em relação à pauta ambiental, houve confrontos diplomáticos com líderes europeus como Emmanuel Macron e Angela Merkel, o que afastou ainda mais a possibilidade de ratificação do acordo.
Do lado do Mercosul, também há cautela. Segundo Eduardo Galvão, professor de relações internacionais do Ibmec Brasília, existem receios sobre os impactos do tratado nas indústrias locais e sobre as exigências ambientais impostas pela Europa, que podem ser vistas como barreiras comerciais disfarçadas.
Além da União Europeia, o Brasil também deve usar a presidência do Mercosul para ampliar o alcance comercial do bloco com outras nações, como Japão e Indonésia. As tratativas, porém, ainda estão em fases preliminares.
Enquanto assume a liderança do Mercosul, Lula terá o desafio de costurar consensos dentro e fora do bloco, em meio a interesses diversos e um cenário geopolítico em constante transformação. A presidência brasileira pode ser decisiva para destravar acordos há muito esperados e redefinir o papel do bloco no comércio internacional.