Após uma série de alertas sobre os riscos associados ao uso de medicamentos manipulados para emagrecimento, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) divulgou novas diretrizes que restringem a utilização de certas substâncias em versões injetáveis. A medida afeta especialmente produtos como as chamadas “canetas emagrecedoras” à base de semaglutida ou tirzepatida, amplamente populares no mercado.
A decisão da agência se baseia em preocupações com a segurança dos pacientes, citando a ausência de controle rigoroso de qualidade nas fórmulas manipuladas, prescrições indevidas e relatos crescentes de efeitos adversos graves.
“Muita gente acha que, por ser manipulado, é a mesma coisa que a medicação comprada na farmácia. Mas não é. Estamos falando de moléculas que exigem estabilidade, controle de temperatura e precisão de dosagem. E isso só é garantido em medicamentos aprovados e fabricados sob rigor farmacêutico.”, explica Djairo Araújo, médico com atuação nas áreas de Nutrologia e Medicina Esportiva.
Por que a mudança?
Publicada por meio do Despacho nº 97, de 22 de agosto de 2025, a nova norma tem como objetivo principal aumentar a proteção à saúde dos pacientes. A Anvisa constatou que determinadas farmácias vinham manipulando e vendendo versões injetáveis de substâncias como semaglutida e tirzepatida sem autorização da agência — muitas vezes com dosagens superiores às indicadas em estudos clínicos.
Durante inspeções realizadas em 2023, a agência encontrou diversas irregularidades:
- Prescrições com dosagens elevadas;
- Substâncias sem aprovação sanitária;
- Falta de testes mínimos de qualidade em farmácias de manipulação.
Segundo o especialista, muitos pacientes sequer sabiam o que estavam aplicando. “Já atendi casos em que o paciente comprou a caneta manipulada por redes sociais e chegou ao consultório com efeitos adversos preocupantes”, alerta.
O que foi proibido?
A regulamentação da Anvisa determina:
- Semaglutida biológica (como a presente no Ozempic®, Wegovy® e Rybelsus®): não pode ser manipulada, já que depende de um processo de fabricação biotecnológico que assegura sua eficácia e segurança.
- Semaglutida sintética: ainda não tem registro aprovado no Brasil, o que impede sua manipulação legal no país.
- Tirzepatida sintética: pode ser manipulada somente com insumos de procedência comprovada e sob condições rigorosas de controle laboratorial.
A decisão não é contra a manipulação como prática, explica o especialista. “A manipulação tem seu valor em contextos específicos. Mas quando falamos de análogos de GLP-1, que exigem estabilidade molecular e refrigeração, o risco de erro é alto demais.”
Para o médico Djairo Araújo, o recado das sociedades é claro: “Não dá para flexibilizar com esses medicamentos. O protocolo correto exige rastreabilidade, conhecimento clínico e estrutura para avaliar o paciente de forma integral.”
Quais são os riscos?
- As versões manipuladas de semaglutida ou tirzepatida, além de não serem aprovadas pela Anvisa, apresentam uma série de riscos potenciais:
- Falta de estudos clínicos que atestem eficácia e segurança;
- Doses instáveis e risco de intoxicação;
- Contaminação cruzada durante a manipulação;
- Falsificações em larga escala vendidas por redes sociais;
- Efeitos adversos como náuseas intensas, vômitos persistentes, pancreatite e inflamações locais.
O médico Djairo já identificou diversos casos em que pacientes apresentaram reações adversas incompatíveis com os efeitos esperados da medicação original. “Em muitos casos, o que estava sendo usado nem era semaglutida de verdade”, alerta o especialista, apontando para o risco das versões manipuladas sem controle adequado.
Na avaliação de Djairo, confiar em soluções fáceis pode ser perigoso. Ele reforça que resultados duradouros e seguros exigem comprometimento. “Se o paciente quer segurança e eficácia, precisa evitar promessas milagrosas. O caminho é tratamento sério, com orientação médica e mudança de estilo de vida.”
Frente à crescente popularidade das “canetas emagrecedoras”, a recomendação dos profissionais de saúde é clara: desconfie de produtos vendidos informalmente, seja por motoboys, em redes sociais ou por meio de receitas padronizadas que ignoram a individualidade de cada paciente.
Esses medicamentos têm ação potente e devem ser usados com responsabilidade, sempre sob supervisão médica. A automedicação ou uso de substâncias de procedência duvidosa pode trazer sérios riscos à saúde.
Embora a decisão da Anvisa represente um avanço importante no controle dessas substâncias, garantir segurança plena depende também de uma mudança de postura — tanto de quem prescreve quanto de quem consome.