A Procuradoria-Geral da República (PGR) está investigando uma empresa por suspeita de corrupção na licitação da COP30 de 2025. Mesmo sob investigação, essa empresa mantém um contrato ativo de R$ 123 milhões com o governo do Pará, ligado à organização do evento.
A coluna de Fabio Serapião revelou que a J.A Construcons integra um consórcio vencedor de uma licitação de R$ 142 milhões, atualmente sob investigação da Procuradoria-Geral da República (PGR) por suspeitas de corrupção.
Registrada em nome de Andrea Dantas, esposa do deputado federal Antônio Doido (MDB-PA), a empresa teria sido usada para financiar um esquema de saques milionários feitos pelo policial militar Francisco Galhardo, preso durante uma dessas operações, segundo a PGR.
Documentos obtidos pela coluna mostram que, no dia em que o consórcio venceu a licitação, 20 de setembro de 2024, Galhardo realizou saques no valor de R$ 6 milhões e, em seguida, comunicou-se com o secretário de Obras Públicas do Pará, Ruy Cabral.
Responsável pela assinatura da maior parte dos contratos relacionados às intervenções da COP30 no Pará, o secretário Ruy Cabral está no centro das negociações.
Apesar do cancelamento da licitação de R$ 142 milhões, motivado pela prisão do policial militar Francisco Galhardo, a J.A Construcons mantém outro contrato com o governo estadual dentro do escopo da COP30.
A empresa faz parte do consórcio Canal Benguí, ao lado da OCC Participações e Construções, que venceu em agosto de 2023 a licitação para a “Adequação dos Canais Benguí, Nova Marambaia e Rua das Rosas (Mangueirão)”. O valor da proposta foi de R$ 123,3 milhões, e a obra representa uma das principais intervenções para o evento em Belém, Pará.
O contrato, que consta no portal oficial do governo do Pará, foi firmado entre Andrea Dantas, esposa do deputado Antônio Doido, e o secretário Ruy Cabral, ambos investigados pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Segundo o Portal da Transparência do estado, as obras avaliadas em R$ 123 milhões estão em andamento, com 87% do trabalho já concluído.
O financiamento da obra é realizado por meio de um empréstimo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Em fevereiro de 2025, o BNDES anunciou a liberação de recursos dentro de um pacote de R$ 250 milhões, destinado a projetos de macrodrenagem e urbanização em Belém, cidade-sede da COP30.
“Os projetos buscam também solucionar os eventos de alagamento enfrentados no bairro do Mangueirão, a ausência de infraestrutura adequada para a coleta e o caminhamento das águas pluviais e as dificuldades de acesso e a circulação no entorno do Estádio do Mangueirão, criando rotas de escoamento de tráfego”, divulgou o BNDES ao repassar os recursos ao governo do Pará.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) solicitou a abertura de investigação envolvendo o deputado Antônio Doido, o policial militar Francisco Galhardo e o secretário de Obras Ruy Cabral. Segundo a PGR, as empresas J.A Construcons e JAC Engenharia, registradas em nome de um funcionário ligado ao deputado, estariam envolvidas em um esquema de corrupção em contratos públicos do governo do Pará.
“Além de as duas pessoas jurídicas que formam o consórcio serem suspeitas de pertencer ao deputado federal (Antônio Doido), diversos elementos circunstanciais adicionais reforçam a suspeita de corrupção de agentes públicos para viabilizar a adjudicação da obra”, diz a PGR.
Os “elementos circunstanciais adicionais”As mensagens mencionadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) foram encontradas no celular do policial militar Francisco Galhardo.
Conforme apontado pela PGR, Antônio Doido, Galhardo e o secretário do governo do Pará“aparentam integrar organização criminosa voltada à prática de crimes contra a administração pública e violações em processos de licitação e contratos administrativos, predominantemente no estado do Pará”.
“Adicionalmente, foram identificadas evidências do cometimento de delitos eleitorais e transgressões contra o sistema financeiro nacional”, informa a PGR.
Defesas
O governo do Pará afirmou em nota que “as empresas J.A Construcons e JAC Engenharia celebraram contratos com a Administração Estadual exclusivamente por meio de processos licitatórios regulares, conduzidos de acordo com a legislação vigente e os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, estando toda a documentação disponível nos portais oficiais de compras públicas”.
Com relação às citações ao secretário Ruy Cabral, a nota indica que, no “exercício de suas funções”, o secretário “mantém interlocução institucional com órgãos da Administração Pública e representantes da sociedade civil exclusivamente para a consecução do interesse público, não se estendendo a qualquer espécie de relação de natureza privada”.
“Jamais foram celebrados contratos ou mantidas relações comerciais com integrantes da Polícia Militar do Estado do Pará, o Secretário não participou de reuniões com o policial mencionado, tampouco recebeu bens, valores ou benefícios de tal agente, e não foi notificado acerca de qualquer investigação ou procedimento administrativo ou judicial que o envolva”, informa a nota.
O governo também complementou que “não possui ciência de qualquer investigação originada a partir das contratações citadas e que, caso seja formalmente notificado, colocará imediatamente todos os mecanismos de controle interno à disposição das autoridades competentes, assegurando a pronta elucidação dos fatos”.
A defesa do deputado Antônio Doido por meio de nota diz que“repudia o vazamento de informações sigilosas de investigações em curso no STF e adotará medidas destinadas à responsabilização dos responsáveis pelo criminoso vazamento”.
“Acerca dos questionamentos formulados, todos eles são fruto de ilações e já foram devidamente esclarecidos nos autos. O Deputado já se colocou à disposição das autoridades para prestar os esclarecimentos solicitados e tem tranquilidade em relação a todos os atos por ele praticados no curso do seu mandato parlamentar”, disse a defesa do parlamentar.
Em comunicado oficial, o BNDES informou que, em junho de 2024, celebrou contrato com o Estado do Pará para financiar obras de infraestrutura urbana, assegurando que todos “são licitados e executados exclusivamente pelo governo estadual, sem participação” do banco público.
O banco também destacou que realiza o monitoramento “técnico-financeiro do financiamento, voltado à execução e entrega dos projeto” e que, caso sejam identificadas irregularidades, “o BNDES aplica as sanções previstas no contrato de financiamento, que incluem, por exemplo, a suspensão dos desembolsos, a restituição dos valores anteriormente liberados para o projeto e a comunicação ao Ministério Público Federal”.
“Importante destacar que o BNDES não recebeu, até o momento, nenhuma informação das autoridades competentes sobre irregularidades no referido projeto”, afirmam na nota.