A Polícia Civil de São Paulo investiga o pastor Davi Nicoletti, líder e fundador da Igreja Recomeçar, por suspeita de envolvimento em um esquema de lavagem de dinheiro. A investigação aponta que a igreja teria sido usada para movimentar recursos oriundos de uma pirâmide financeira envolvendo criptomoedas.
Segundo dados do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), mais de R$ 4 milhões foram depositados na conta da igreja em um período de um ano, vinculados ao grupo sob suspeita. Ao ser contactado, ele afirmou que o inquérito será arquivado e classificou o relatório do Coaf como “mentiroso”.
Nicoletti, que conta com 72 mil seguidores no Instagram, viralizou no último mês com um vídeo em que chama o presidente Lula (PT) de “ladrão” e declara que “odeia pobre”. O pastor defende a ideia de que os cristãos devem buscar prosperidade financeira.
“Eu odeio pobre. E eu vou dizer que Jesus nunca foi pobre. E se te falaram isso, mentiram. Porque o pobre não é só pobre financeiramente, ele é vítima de alguém que o fez ficar pobre. Ele sempre entende que o mundo deve para ele, e a culpa é de quem tem mais”, afirmou o líder religioso em declaração registrada pela coluna de Paulo Cappelli, no Portal Metrópoles.
O pastor ainda afirmou que “existem muitos cristãos ladrões dentro da igreja que roubam do altar e ainda condenam a corrupção” durante a celebração religiosa. Após o vídeo ganhar grande repercussão nas redes sociais, ele alegou ter sido mal interpretado.
Documentos obtidos pela coluna revelam que, entre dezembro de 2018 e dezembro de 2019, a igreja liderada pelo pastor Nicoletti recebeu R$ 4,03 milhões provenientes de um grupo investigado por operar um esquema de pirâmide financeira ligado a investimentos em criptomoedas. Essas movimentações financeiras foram detalhadas em um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
“A fim de maquiar lastros do dinheiro arrebanhado de forma fraudulenta, tais pessoas enviaram dinheiro para a conta pertencente à Igreja Ministério Recomeçar, de propriedade do pastor Davi Nicoletti”, diz o relatório policial. “Também se apurou que as transferências não possuíam justificativas econômicas claras”, A investigação, iniciada em 2019 pela Polícia Civil de São Paulo, segue em andamento para apurar suspeitas de lavagem de dinheiro.
O Ministério Público do Ceará (MPCE) aguarda a conclusão do inquérito policial aberto pela Delegacia de Combate aos Crimes de Lavagem de Dinheiro para investigar a MDX Capital Miner Digital LTDA, empresa envolvida em um esquema de pirâmide financeira. Em nota, o MPCE informou que solicitou novas diligências para aprofundar a apuração de crimes de estelionato e lavagem de dinheiro relacionados ao caso.
A MDX Capital, que enfrenta dezenas de processos judiciais movidos por investidores lesados, teria aplicado o golpe em cultos realizados na Igreja Batista Comunidade do Amor, em abril de 2019. Em um dos processos, duas vítimas relataram prejuízos que somam R$ 200 mil após investirem no esquema fraudulento.
Declaração do pastor Davi Nicoletti sobre as acusações de lavagem de dinheiro
Por meio de nota, a defesa do pastor Davi Nicoletti afirmou que o inquérito da Polícia Civil de São Paulo, instaurado para apurar suposto crime anterior à prática de lavagem de dinheiro, foi arquivado pela Justiça. A decisão, segundo o comunicado, ocorreu após parecer do Ministério Público, que considerou não haver indícios suficientes para levar o caso adiante na esfera penal.
“Como é sabido, a lavagem de dinheiro exige a comprovação de um crime anterior (crime antecedente), o que, no caso, não ocorreu. Assim, a autoridade judiciária, com base nos autos e em conformidade com o Ministério Público, determinou o arquivamento do feito, nos termos do artigo 18 do Código de Processo Penal e da Súmula 524 do STF. Portanto, não subsiste nenhuma acusação criminal válida ou em trâmite contra a Igreja Recomeçar, ou o Pastor Davi Nicoletti”, informou a defesa.
Segundo a defesa de Davi Nicoletti, o inquérito arquivado pela Justiça estava relacionado à empresa MDX Capital. Já a investigação que apura o suposto uso da Igreja Recomeçar para lavagem de dinheiro continua em curso. Apesar de o Ministério Público ter pedido o arquivamento do caso, o processo ainda não foi oficialmente encerrado.
Ao ser questionado sobre possíveis vínculos com a MDX Capital, o pastor Davi Nicoletti afirmou que um dos responsáveis pela empresa era apenas um frequentador da Igreja Recomeçar, assim como outros membros que procuram apoio religioso e aconselhamento pessoal.
“Essa relação nunca se confundiu com vínculos comerciais ou societários. O Pastor Davi Nicoletti não é, nem nunca foi, sócio, gestor ou beneficiário da MDX Capital Miner Digital, tampouco participou de qualquer atividade econômica da empresa”, completou.
Sobre o relatório do Coaf que identifica uma movimentação de R$ 4 milhões entre a igreja e integrantes do grupo investigado, o pastor contestou a veracidade do documento, classificando as informações registradas no inquérito como falsas.
“Essa alegação não está correta. No período mencionado nos autos (ano de 2019), a Igreja contava com 6 unidades ativas e, somando todos os membros das unidades (milhares de pessoas), as ofertas recebidas naquele ano não atingiram R$ 1,5 milhão. Quanto aos valores eventualmente transferidos por pessoas vinculadas à MDX se referem a pequenas ofertas voluntárias, como tantas outras realizadas por membros e frequentadores”, encerrou.