Enquanto mais de 3,7 bilhões de pessoas ao redor do mundo ainda lutam para sobreviver com menos de US$ 8,30 por dia (cerca de R$ 45), o 1% mais rico da população global viu sua fortuna crescer de forma recorde nos últimos anos. Desde 2015, mais de US$ 33,9 trilhões, o equivalente a R$ 185 trilhões, foram acumulados pelos mais ricos, valor suficiente para erradicar a pobreza no planeta 22 vezes. A constatação é do novo relatório da Oxfam Internacional, intitulado “Do Lucro Privado ao Poder Público: Financiando o Desenvolvimento, Não a Oligarquia”, divulgado nessa terça-feira (25).
O estudo chega às vésperas da 4ª Conferência Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento, marcada para o próximo dia 30 de junho, em Sevilha, na Espanha, com a presença de representantes de mais de 190 países.
De acordo com a Oxfam, a riqueza de apenas 3 mil bilionários cresceu US$ 6,5 trilhões (R$ 35,4 trilhões) desde 2015, e já representa 14,6% de todo o Produto Interno Bruto (PIB) global. A disparidade é ainda mais evidente quando se compara o crescimento da riqueza privada e pública: entre 1995 e 2023, a riqueza privada global aumentou US$ 342 trilhões (R$ 1,86 quatrilhão), enquanto a pública subiu apenas US$ 44 trilhões (R$ 239,8 trilhões).
“Essa concentração extrema de riqueza está sufocando os esforços para acabar com a pobreza”, afirma Amitabh Behar, diretor executivo da Oxfam Internacional. Segundo ele, os interesses de uma minoria bilionária vêm sendo priorizados em detrimento das necessidades da maioria da população global.
O relatório também alerta para cortes drásticos na ajuda humanitária e ao desenvolvimento por parte dos países mais ricos. As nações do G7, responsáveis por cerca de 75% da ajuda oficial internacional, planejam reduzir esses repasses em 28% até 2026, em comparação com 2024. A Oxfam projeta que esse corte pode causar a morte de até 2,9 milhões de pessoas até 2030, apenas por doenças relacionadas ao HIV/AIDS.
Além disso, 60% dos países mais pobres enfrentam grave crise de endividamento. Muitos deles estão pagando mais aos credores, em sua maioria privados e resistentes a renegociações — do que conseguem investir em áreas essenciais como saúde e educação.
Apesar do cenário alarmante, há amplo apoio popular por mudanças. Uma pesquisa realizada em 13 países, entre eles Brasil, Canadá, França, Índia, África do Sul e Estados Unidos, mostra que 9 em cada 10 pessoas defendem a taxação dos super-ricos como forma de financiar serviços públicos e combater a crise climática.
A Oxfam defende uma mudança urgente no modelo de financiamento global, atualmente voltado para os interesses do setor privado, conhecido como “consenso de Wall Street”. Para a organização, esse modelo falhou: gerou poucos recursos para o desenvolvimento, ampliou as desigualdades e prejudicou os países mais vulneráveis.
“Os países ricos colocaram Wall Street no volante do desenvolvimento global. Está na hora de tirar esse modelo do caminho e colocar o interesse público como prioridade”, reforça Behar.
Entre as propostas da organização estão:
- Criar alianças entre países para combater a desigualdade;
- Reduzir a dependência do setor privado e investir em serviços públicos;
- Taxar os ultrarricos;
- Reformar o sistema global de dívidas;
- E adotar indicadores além do PIB para medir o bem-estar social.
As sugestões do relatório serão apresentadas oficialmente na conferência em Sevilha, com o objetivo de pressionar líderes globais a adotar medidas concretas e justas para reequilibrar o sistema econômico mundial. Segundo Amitabh Behar, “trilhões de dólares estão aí, mas concentrados nas mãos de poucos. Os governos precisam ouvir o que o mundo está pedindo: taxar os ricos e investir no que realmente importa, como saúde, educação e energia limpa”.