Mesmo dez anos após o rompimento da barragem do Fundão, em Mariana (MG), a luta por justiça ainda marca a vida dos atingidos. Uma das sobreviventes, Mônica Santos, auxiliar em um consultório odontológico à época do desastre, relata que as lembranças permanecem vivas. “É como se estivesse tudo acontecendo agora”, afirmou à Agência Brasil. Hoje, aos 40 anos, ela está desempregada.
O rompimento da estrutura da Samarco em 5 de novembro de 2015 liberou cerca de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração, resultando na morte de 19 pessoas e deixando mais de 600 desabrigadas. Além de Bento Rodrigues, onde Mônica vivia, outras localidades como Paracatu de Baixo, Paracatu de Cima, Pedras, Águas Claras e Campinas foram atingidas.
Mônica lembra que saiu de casa para trabalhar por volta das 6h da manhã e só conseguiu retornar 24 horas depois. A ficha caiu quando, ao amanhecer, conseguiu avistar sua casa de um ponto mais alto: “Foi nesse momento que a ficha caiu. Eu não tinha mais nada”. Ela vivia apenas com a mãe e conta que sempre ouviu da empresa que não havia risco, já que a barragem era monitorada 24 horas por dia. Ela ainda lamenta a perda de cinco amigos próximos.
A líder comunitária mora atualmente no reassentamento de Novo Bento Rodrigues, construído pela Samarco e localizado a cerca de 13 quilômetros da antiga comunidade. Porém, afirma que os problemas persistem. “Mas a nossa casa ainda está cheia de problemas. A gente não pode falar que foi entregue 100%. Uma vez que ainda tem casa sendo construída e ainda tem morador desabrigado que nem projeto de casa tem”. Segundo ela, os imóveis entregues ainda não foram transferidos oficialmente para o nome dos moradores.
Mônica diz que seguirá reivindicando responsabilização e reparações. ““Enquanto eu tiver força, vou lutar para fazer com que as pessoas sejam de fato indenizadas e restituídas”. Para ela, a ausência de punições contribuiu para que o desastre de Brumadinho, que matou 272 pessoas em janeiro de 2019, tenha ocorrido: “Se tivesse acontecido a punição, não teria ocorrido a tragédia de Brumadinho”.
Para Márcio Zonta, membro da direção nacional do Movimento pela Soberania Popular na Mineração, o desastre evidencia que as decisões sobre mineração não consideram a população atingida. “São projetos antidemocráticos em que as empresas não levam em consideração as organizações e populações”, avaliou.
Zonta destaca ainda a falta de reparação adequada e a inexistência de um plano nacional de mineração. O Brasil possui 916 barragens, das quais 74 são consideradas de maior risco e 91 estão em situação de alerta. Segundo ele, tragédias semelhantes ainda podem acontecer, especialmente em Minas Gerais, onde há 31 barragens. Para o ativista, os episódios de Mariana e Brumadinho representam o colapso do Sistema Sul de Mineração da Vale.
A Samarco informou, em reportagen à Agência Brasil, que, desde 2015, destinou R$ 68,4 bilhões para ações de reparação e compensação, incluindo R$ 32,1 bilhões pagos em 735 mil acordos de indenização individual. A empresa afirma que esses recursos “têm transformado a realidade econômica da bacia, estimulando o comércio, fortalecendo cadeias produtivas e gerando empregos”.
O agricultor Francisco de Paula Felipe conta que, há dois meses, se mudou para sua nova casa no reassentamento e mantém a esperança de que a situação melhore. Ele disse que recebeu parte da indenização e aguarda decisão judicial sobre o restante. “Não foi fácil a gente viver esses dez anos”, relatou. Ele diz que torce por saúde para seguir em frente: “Acabar de terminar de criar minhas duas filhas, ver elas estudarem e conseguir tomar o rumo da vida delas”.













